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Ediyporn

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Sexar é um verbo como fotografar

Giulia Martini

Eu gosto muito de pornô, ponto.
Eu sou aquela pessoa que abre a aba anônima no Xvideos pra ver como tá o desejo da galera pelo mundo pelo ranking de mais vistos. E aí já começa, “ah, a narrativa da novinha; o desejo intrafamiliar classics; ih essa coisa do p.o.v htcis meio ultrapassada que você não vê o cara, será isso também um medo de desejar o pau?”

Coisa de quem morou sozinha? Mercúrio em peixes? Apreço pela análise?
Poderia estar num artigo com mais estudo, numa mesa de bar com mais tempo, e com certeza eu vou comentar com vocês.

Me interessa entender o desejo a partir da representação, o que ele movimenta, o que ele diz ou não diz do desejo sexual que vivemos socialmente. Nosso desejo diz, e não diz sobre quem somos.

Gosto de pornô, mas já não gostei. Comecei a estudar pornografia justamente por me sentir atacada pelas imagens produzidas. No meu tcc conto de uma vez que parei um vídeo para chorar, desesperada com a violência e o olhar vazio da performer. A partir do incômodo, aprendi sobre questões éticas de produção, entendendo que há permissão para certos desejos e conjecturando possibilidades de juntar essa permissão com uma produção que seja ética, estética e desejante.

Tem jeito, viu.

Nessa pesquisa, me formei propondo e pensando uma pornografia lenta, não-genital, corpórea e ritualística.

Aqui no Brasil tem uma galera pensando e produzindo pornografia desviante, como uma paixão minha, a Ediy Porn.
Hoje, venho fazer uma coisa que eu amo: analisar desejo e imagem – Ô DELÍCIA.

Se você é des minhes, vem se esbaldar comigo.
Se você não é, eu convido a dar uma chance pro olhar e para pensar a representação e o desejo.

Bora?

ME FODE

Eu já vi muito pornô, de vários tipos, de várias narrativas, e pessoalmente, já não são muitas coisas que me excitam.

A proposta estética de Me Fode é bem interessante, conta com multitelas, performers muito cientes do voyeurismo/exibicionismo e usando disso com maestria, multinarrativas não sequenciais pautadas pelo desejo e sexo.

Obrigada a exu pelo home office, porque em certo momento vendo Me Fode, eu estava gemendo junto sem nem me tocar *prazeres épicos*.

A condução musical é alto astral e as interações levam a gente pra pensar nesse lugar da permissão, do desejo e do brincar no sexo: brincar com o olhar do outro, de si, com o lugar, com a prática, com os limites físicos e espaciais, já que, sexo também é contexto. Jogar com o desejo, com o erro, com a intimidade, com os fluidos corporais. Isso que me instigou, porque eu não percebi isso sendo construído no meu corpo, uma hora, aconteceu.

Foi delicioso me sentir arrebatada fisicamente enquanto vivia um prazer bem racional.

Uma das grandes belezas de Me Fode aconteceram numa cena em que BixaPuta tá usando um plug anal lindíssimo, e na hora que Ramiro o puxa, vemos um pouco de lub sair marrom, que Ramiro lida com pontualidade e delicadeza, recolhendo e tirando do espaço com as mãos. E essa beleza que a Ediy traz de naturalizar o corpo e seus fluidos, afinal sexo também é genital, e genital também tem urina e fezes.

Com Me Fode, aprendi que o transar e o seduzir são um brincar de gente que pode consentir, e na delícia que isso tem, já que a atmosfera é de um jogo safado e delicioso, de uma permissão dos sentidos e do agir.

QUINTAL

Quintal é meu tipo preferido de sexo e preferido de imagens.

Cheio de coreografias lentas, onde sexar é um verbo como fotografar, comer, beber, aninhar, rir, seduzir e deitar na rede.

É delicioso ver o tempo da interação tomar espaço, e dentro desse tempo particular, perceber como duas pessoas que tem ritmos diferentes de sexo encontram juntes um dançar.

Ver Quintal é pensar no carinho e cuidado de dois corpos pretos interagindo com tempo, autonomia e presença, o que é tão difícil de ver em todas as narrativas visuais, não só na pornografia.

O gozo em quintal é um estado da interação, que não é pautada em clímax de ejaculação, o prazer se constrói a todo momento, na troca e contato das peles. É um curta praticamente não verbal, onde podemos ver o corpo se comunicando, com seus limites e propostas.

A fotografia é lindíssima e acompanha a proposta da interação, lenta, cuidadosa, e muito bela, eu teria alguns frames emoldurados em casa.

Quintal me traz a presença do prazer das peles e da oralidade, beijos, morangos e suco, bocas que buscam o corpo do outro. Sexo e gozo existem sem penetração e no corpo inteiro. A diferença da coreografia proposta pela pornografia mainstrem é absoluta.

REFEIÇÃO FAVORITA

Ana Maria Braga teria orgulho desse café da manhã, eu não como gema mole, mas que tava bonito, tava.

Um sexo matinal daqueles bonitos, repeteco da noite anterior, um tesão vivo.

Refeição Favorita tem elementos mais comuns do que associamos a pornografia, o casal, o café da manhã, penetração peniana, e quis trazer ele pra cá porque  tenho investido em perceber outras coreografias sexuais possíveis dentro das coreografias que já conhecemos bem. O riso no meio do sexo, a baba, caretas e grunhidos de tesão.

Que são elementos super presentes em Refeição Favorita. O ministério do namoro quando for instituído precisa distribuir mangas suculentas como as do curta, eu também quero.

MARGARIDAS

Não conheço quem consegue manter o sadismo/práticas de impacto e a ternura como Alò consegue. Essa marca da sua condução é algo que sempre me surpreende, instiga e inspira.

“Menina é mais tranquila”, pensei ironicamente ao ver uma com olhar doce e uma marreta na mão, a outra dizendo “marreta minha buceta”.

Alò, quando ouve o pedido de Tormenta diz “tem certeza amiga? acho melhor não, é muito pesado”, o que começa a negociação e a prática de impacto com cuidado.

O BDSM traz pra gente a oportunidade de viver desejos que tem risco com segurança – o cuidado verbal e explícito de parceiras de jogo e a negociação constante das práticas brilha em Margaridas.

Esteticamente, esse curta consegue também propor um paradoxo: fofo, com seus elementos visuais de lingeries de florzinhas, práticas de skincare no meio da tarde em um apartamento com plantas em São Paulo; e violento trazendo práticas de impacto com marreta, grampos, tapas.

Enquanto terapeuta sexual na clínica, propomos esse espaço de pensar o desejo sexual do interagente, buscando o que é entusiástico, livre e de interesse dessa pessoa.
Algo que Margaridas traz é a ideia de que, no sexo, também lidaremos com personas sexuais. O sexo tem sim um caráter performático, não no sentido de performar para alguém, acessar um tipo de orgasmo ou prática, mas quando transamos acessamos personas que não acessamos em outros espaços – quando vamos ao banco ou andamos com o cachorro.

No making of durante os créditos, vemos que Tormenta, a putinha obediente que conta os tapas é uma persona. Que, fora do contexto da prática, existe de outra forma, vemos seu limite sendo clara e verbalmente colocado quando o assunto é estourar espinhas.

Pra fechar, O making off traz cenas de “erros” que são preciosos no contexto de educação sexual: lavar os dildos, limites de práticas de acordo com o que             se sente naquele momento, negociações informadas.

Esses são apenas alguns dos curtas presentes no catálogo da Ediy, que está sempre produzindo novos filmes e algumas sessões de exibição por aí.
Já recebi muitos pedidos de recomendação de pornografia, então fica aqui a queridíssima produtora brasileira independente que vem arejando muitos imaginários.

por Giulia Martini
revisão Clarissa O’neill

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